a primeira parte desse texto viralizou (o que achei muito louco, para falar a verdade, mas também simbólico a como estamos famintos de algo outro que não esse modelo atual). deixo aqui se você quiser ler:
*notas*
ainda tento buscar respostas. de como criar uma vida abundante e criativa diferente das ordens vigentes. eu sei que isso é um grande privilégio, mas me aposso dele o quanto posso. me parece um pouco egóico também, talvez? achar que se pode fazer diferente, sendo que o que temos já é tão diferente de outrora. mas pego o bastão. confio, porque sei que esse desejo não é apenas meu e também não foi orquestrado por mim. ele tem um quê de divino. começa em mim (na gênese desse desejo tão antigo), mas se espalha como semente para todos os outros que como eu nunca sentiram que se encaixaram, que como eu, sofreram por viver em uma roda que aperta, compartimenta, segmenta e nos obriga que sejamos diferentes de nossa própria natureza.
é preciso constância para mudar os próprios hábitos de fazer as coisas. mas é preciso também paciência em saber que haverão muitas recaídas - como um vício em qualquer coisa. você precisa não só continuar fazendo, mesmo após a recaída, mas também encontrar novas formas de fazer velhas coisas que já ficaram obsoletas dentro do seu coração.
sei que, como eu, muitos estão buscando alternativas. porque a coisa toda saiu um pouco do controle. quando falo de coisa, quero dizer o mundo. a forma que a gente vive. saiu do controle. e vai continuar saindo, por lugares que nós ainda nem conseguimos ter ciência. tudo vai começar a mudar de forma orquestrada muito em breve. grandes estruturas que conhecíamos como certas começarão a se dissolver - e, como sempre, o que antecede todas essas coisas é o caos. e, para sobreviver ao caos, precisamos de estruturas internas sólidas para que não entremos em combustão junto com o mundo.
estamos buscando alternativas porque estamos exaustas e sem garantias. os modelos que hoje estão vigentes, todos eles, já nos parecem obsoletos. parece que tudo que foi criado, embora nos trouxe inúmeras facilidades, também destruiu nossa saúde mental e física. estamos loucos, exaustos, sedentários, sem perspectivas. quero dizer, eu sei que alguns de nós já estão fazendo diferente, mas vez ou outra são capturados pela loucura do mundo, por essa degradação contínua de tudo que temos de mais natural e selvagem.
o mundo parece estar se transformando em algo inóspito: sentimentos gerados por inteligência artificial; nossa noção de eu sendo ditada em uma bio de instagram com X caractere. nossas opiniões, também, fragmentadas em carrosséis ou vídeos de 15 segundos.
fragmentada. talvez essa seja a palavra que rege nossa psique de tempos modernos. tentando se sacrificar de forma nobre por si mesmo; empreendedores de si (como disse Byung-Chul Han) ou pior: deus de si mesmo, criadores da própria história. todos com um vazio enorme no peito, é claro. mas nada que uma medicação não possa ajudar.
fragmentados. pensamentos interrompidos pela mais nova trend do tik tok. vídeos com movimentos que parecem robóticos, sorriso no rosto para disfarçar o desgosto.
não quero ser pessimista. ao mesmo tempo vivemos um bom momento: temos mais liberdade de ser quem somos, podemos fazer dinheiro com infinitas coisas. mas me pergunto se essa infinitude tem sido positiva. temos liberdade demais, mas ao mesmo tempo nos conhecemos tão pouco; ao mesmo tempo estamos tão alucinados pelo nosso próprio ego e por como podemos fazer mais dinheiro e mais rápido que esquecemos que tudo que viemos criando regenera pouco e destrói muito.
estamos destruindo a nós mesmos como raça humana? estamos divagando pouco e portanto sendo pouco visionários? nosso imediatismo irá nos tirar a força da natureza? como respiraremos ali na frente? como será a vida dos nossos netos?
está chegando logo a frente um golpe muito maior que um golpe de estado. um grande golpe mundial está sendo prenunciado. aquilo tudo que viemos tão fortemente nos apegando, perceberemos que não tinha tanto valor assim. uma nova conjuntura de mundo será criada, muitos novos tipos de guerra serão gerados, economia irá cair e subir - em uma rapidez nunca antes sentida.
a mudança climática já é realidade. não dá para fugir. o que tínhamos que fazer, fizemos? não sei. na verdade, eu nem quero saber, porque senão não durmo de noite.
gosto, porém, dessa passagem escrita pelo filósofo slavoj zizek em seu livro em conjunto com o teólogo boris gunjevic, “o sofrimento de deus - inversões do apocalipse":
“Quando ele estava saindo do templo, um de seus discípulos lhe disse: "Olha, Mestre! Que pedras enormes! Que construções magníficas!
”Você está vendo todas estas grandes construções? ", perguntou Jesus. "Aqui não ficará pedra sobre pedra; serão todas derrubadas".
Tendo Jesus se assentado no monte das Oliveiras, de frente para o templo, Pedro, Tiago, João e André lhe perguntaram em particular:
"Dize-nos, quando acontecerão essas coisas? E qual será o sinal de que tudo isso está prestes a cumprir-se? "
Jesus lhes disse: "Cuidado, que ninguém os engane.
Muitos virão em meu nome, dizendo: ‘Sou eu! ’ e enganarão a muitos.
Quando ouvirem falar de guerras e rumores de guerras, não tenham medo. É necessário que tais coisas aconteçam, mas ainda não é o fim.
Nação se levantará contra nação, e reino contra reino. Haverá terremotos em vários lugares e também fomes. Essas coisas são o início das dores.(...)
Se, então, alguém lhes disser: ‘Vejam, aqui está o Cristo! ’ ou: ‘Vejam, ali está ele! ’, não acreditem.
Pois aparecerão falsos cristos e falsos profetas que realizarão sinais e maravilhas para, se possível, enganar os eleitos.
Por isso, fiquem atentos: avisei-os de tudo antecipadamente” - Marcos 13:1-23“São versos espetaculares em sua inesperada sabedoria (...) Sua mensagem é: sim, é claro, haverá uma catástrofe, mas ficai pacientemente atentos, não acreditai nela, não ficai presos em extrapolações, não vos entregai ao prazer propriamente perverso de pensar ‘Então é isso!' em suas diversas formas (o aquecimento global vai nos extinguir em uma década, a biogenética representará o fim da existência humana, etc etc.). Longe de nos seduzir para um arrebatamento perverso e autodestrutivo, adotar a posição propriamente apocalíptica é, mais que nunca, a única maneira de manter a cabeça fria” - página 58.
será que o que precisamos agora é mais de deus? me pergunto. mas não esse deus completamente volátil que temos criado. esse deus que nos manda comprar roupas de marca e viagens caras (pego emprestada essa frase da
); que nos veste com grandes logos ostentando nossas roupas de mais de mil doláres. esse deus que cria igrejas com áreas vips para aqueles que tem milhões de seguidores e reais no bolso. eu não sei, mas me parece novamente os fariseus que jesus tanto condenava. é esse deus (que separa) que precisamos? esse deus que julga? na teologia esta é a definição de deus:“Deus é o Ser Supremo Espírito Infinito, Eterno, Imutável em seu Ser, Sabedoria, Poder, Santidade, Justiça, Bondade, Verdade e Amor, Único, Perfeito, Criador e Sustentador do universo, Pessoal e subsiste em três Pessoas ou Distinções: Pai, Filho e Espírito Santo".
até as religiões foram compradas. desvirtuadas pelo ego do homem. agora, sabemos sobre tudo a um clique. e me desculpe, também não tem nada alternativo para nos salvar. os líderes espirituais também fizeram besteira. abusos de corpo e de poder. somos a primeira geração que sabe de tudo a um clique. isso é ótimo, mas também nos tira toda e qualquer estrutura. somos a primeira geração a não ter ao que recorrer. a ter que criar a própria trajetória de fé e de profissão. até porque não existe mais profissão e só o que nos resta é a fé. mas ter fé em quê? ter fé em nós mesmos já se comprovou um fardo; eu, eu e eu foi o que nos trouxe até aqui. então fé em quem?
achamos que a solução disso tudo é um detox digital. talvez seja. por um momento. para desanuviar a mente. detox digital é o novo vipassana. mas também esquecemos que é uma ilusão. desligamos nosso celular, mas a tecnologia continuará pairando energeticamente em todo nosso ser. o wi-fi de todos criando uma camada nova no planeta. o cartão de crédito por aproximação. não aceitamos dinheiro, só pix. ou você quer que eu pegue a maquininha?
é difícil porque se você quer ser da lógica vigente e não ver sua vida escorrer sendo clt, você vai precisar divulgar seu trabalho. uhum, você vai precisar estar aqui que nem eu, escrevendo para uma plataforma.
tem outro jeito? alguém encontrou outro jeito? já li pessoas que conseguiram viver sem dinheiro. quem conseguiu fazer diferente, com certeza não está aqui no substack para me dizer. ou talvez esteja só ocasionalmente para compartilhar algo que o coração quer transbordar? se você estiver aqui, conta para gente? como você conseguiu se desvincular totalmente do modelo vigente? como você ganha dinheiro?
porque eu não compro mais esse modelo de larguei tudo e fui viver em uma ecovila. todo mundo que conheci até hoje ficou rico antes disso e foi viver em uma ecovila com casa própria. quero saber daqueles menos privilegiados, que não tiveram nenhum centavo para investir. é possível? ou até o sonho livre onde tudo nos será dado terá que ser feito pelo esforço do capital primeiro?
como sempre, não trago respostas. eu não cheguei lá e nem em lugar nenhum. quero dizer, todas as coisas mais importantes que tenho na vida não são posses. são coisas que construí querendo me moldar melhor aquilo que deus espera de mim. o que tenho são bons amigos, um casamento incrível, dois gatos que eu amo e uma inclinação a fazer aquilo que eu realmente acredito - e infelizmente isso me gera uma conta bancária por vezes menor do que eu gostaria. será que é por que não acredito em mim o suficiente? não tenho bons pensamentos o suficiente? ou por que tenho valores muito firmes que me são como pedras no calcanhar?
mas o que mantém a minha chama viva é essa tal de esperança. “adotar a posição propriamente apocalíptica é, mais que nunca, a única maneira de manter a cabeça fria", então que assim seja. que tenhamos consciência de todas as mudanças, de todos nossos comportamentos vis, mas que ainda assim acreditemos no amor sob todas as coisas. que tenhamos confiança que esse amor, no final, nos mostrará o caminho.
se por um lado vejo com crítica (amorosa, mas nem sempre) tudo que acontece nessa velocidade do mundo, também vejo o lado compassivo da equação. esse lado em que discutimos tudo que acontece e que tentamos enxergar uma nova luz, uma nova criação. no final, essa é a gênese a qual devemos buscar e também ofertar: ver tudo sob essa ótica da nova criação, pois o que vem depois da destruição é justamente isso: nova criação.
e esta é a beleza, no fim.
no último texto trouxe a esperança desse mundo novo ao qual queremos criar - e que geralmente começa pequeno, em nossa própria realidade e depois se espalha como sementes férteis por aí. continuo acreditando nisso: na força e na fé das pequenas iniciativas. dos pequenos grupos que criamos para pensar nessa nova criação. dos textos que escrevemos por conta própria e não por inteligência artificial, falando sobre o que vemos e pensamos para criar uma corrente de novos pensadores da atualidade. a meu ver, esse é o antídoto de parte da exaustão sentida até então e também uma maneira de acender essas chamas internas que vez ou outra parecem se apagar.
é quando estamos em pequenas comunidades e ousamos discordar uns entre os outros que enxergamos a chama novamente acesa. saímos de uma bolha de anestesia e encaramos um pedaço melhor da própria realidade: vamos juntando as peças que faltam. e quando fazemos isso por amor e com amor, os resultados são extraordinários. é nesse tipo de futuro que prefiro acreditar, é esse tipo de posição propriamente apocalíptica que prefiro adotar.
confio no sabor do novo. mesmo que para ele chegar, muita coisa precise se orquestrar, destruir e se regenerar.
com amor,
camila.
caraca. que forte, que bonito, que necessário. há tempos não lia algo assim. parabéns!